Alceu Valença apresenta o show Valencianas e revisita suas raízes portuguesas
Em dois concertos, no Porto e em Lisboa, acompanhado pela Orquestra Ouro Preto, o cantor pernambucano relembra seus maiores sucessos. Ao PÚBLICO Brasil, ele fala de sua história e de seus projetos.
Os classicos Tropicana, La Belle de Jour, Coração Bobo e outros sucessos de Alceu Valença vão embalar o Porto e Lisboa. Em 8 de fevereiro, na Casa da Música, e no dia 9, no Centro Cultural de Belém, o cantor pernambucano apresenta o espetáculo Valencianas, acompanhado pela Orquestra Ouro Preto.
Alceu descreve o que as pessoas vão encontrar nos espetáculos. “Os dois concertos são feitos em cima da musicalidade do agreste meridional pernambucano, que é o sertão profundo. É uma cultura que começa lá no sertão e chega até a Serra da Canastra, em Minas Gerais. Aí, com o correr do tempo, a gente botou umas suítes, um frevo chamado Acende a Luz, uma música com sonoridade lusitana, Borboleta, e o P da Paixão”, relata, referindo-se a uma letra que ele escreveu.
No show, ele vai aproveitar para celebrar os 25 anos da Orquestra Ouro Preto, formada pela família Toffolo. Dirigida pelo maestro Rodrigo Toffolo, o grupo acompanha Alceu desde 2012. “Mas não só eu. Eles já tocaram com Milton Nascimento, João Bosco e outros músicos e até tocaram Beatles”, diz. O repertório da orquestra, segundo Toffolo, inclui Vivaldi, Villa-Lobos e outros compositores clássicos.
O concerto em Lisboa está esgotado e, no Porto, sobram poucos bilhetes. No espetáculo de Londres, todos os bilhetes tinham sido vendidos em novembro último. Para trazer a orquestra, com 30 músicos e mais o pessoal da produção, foram feitos dois espetáculos no Brasil, cuja bilheteria foi toda para pagar as viagens. No total, são 50 pessoas na realização dos shows.
Visitar as origens
Para Alceu, estar em Portugal é uma forma de visitar suas origens. “Vir para Portugal, para mim, é encontrar minhas raízes, que são todas daqui. Minha família vem de Portugal, e tenho uma certa lusitanidade dentro da minha música, coisa que eu não notava”, diz.
Nascido em São Bento, no agreste meridional pernambucano, há 78 anos, o cantor fala da portugalidade das pessoas da sua cidade. “Na minha terra, todo mundo era de origem portuguesa. Os Braga, que vinham de Braga, os Sintra, os Porto e os Valença, de Valença do Minho. E tinha os Mota, os Oliveira e os Paiva também”, lembra.
Alceu descreve São Bento como uma cidade com uma vida cultural muito rica. “Existia uma comunidade. Na minha terra, a diferença era muito pouca, não havia pobreza muito grande e também ninguém era muito rico. Todo mundo tinha um bom nível intelectual, e acho que é uma das cidades que mais tem escritores no mundo em relação ao número de habitantes. Muitas pessoas publicavam livros e, quando chegou o serviço de alto-falante, elas liam suas crônicas e poesias. Era uma cidade de 5 mil habitantes, que tinha três grupos de teatro e dois cinemas”, descreve.
Numa cidade pequena, com poucas relações com as pessoas de fora, Alceu conta que todos eram familiares um do outro. “O meu avô materno, que era parente do avô paterno, que era parente da avó materna, uma grande mistura. É por isso que eu sou doido”, brinca. Diz que até a babá que cuidava dele era aparentada.
Alceu ressalta que vivia num meio em que a música era parte do dia a dia. “Dizem que meu avô materno tocava bandolim e tio Nô, Agenor, que era o irmão dele, tocava e violino e piano.” Também da parte do pai vivia-se a música intensamente. “Meu tio Lucílio e vovô eram uma dupla, com o nome de Patativa e Azulão. Não eram profissionais, mas cantavam, tocavam viola, faziam versos de improviso e fizeram até um folheto. Só pensavam nisso. Tio Rinaldo tocava violão muito bem. Vovô tocava e lia música. Ele tocava viola de violeiro e até música clássica no violão dele”, recorda.
Contudo, se dependesse da família, Alceu seguiria outro caminho. “Meu pai tinha muito medo que eu fosse cantor, porque eu podia ser igual aos dois irmãos dele, que não se deram bem na música”, afirma.
Novo projeto
A forma de criar de Alceu é espontânea. “Um dia, estava no meio da cozinha e comecei a pensar numa coisa: um concerto aonde eu posso misturar a música ibérica com a da gente de lá. Juntar as duas culturas”, explica.
Outra ideia que tem na cabeça é a de um novo filme, que seria o segundo dirigido por Alceu Valença, depois de A Luneta do Tempo, de 2014. “Tenho ideia de um documentário. Estou andando na rua, saio do porto de Lisboa e aí minha mulher diz assim: ‘Alceu, quando estou aqui, só me chame de Fada Lusitana’”, diz, descrevendo a primeira cena que imaginou.
O artista conta que está criando o texto, que lembrará a toada dos cantadores. E recita, lendo do celular, o que preparou para uma cena em Pernambuco: “Sou natural de São Bento,/ do Norte de Pernambuco,/ fui um menino travesso,/ traquina e maluco/ Ouvia aboios, toadas/, pelos vaqueiros cantadas,/ vozes da seca e do luto./ Em São Bento, de sanfona,/ de oito baixos tocada./ Violeiros cordelistas,/ o que está de embolada/ no altofalante eu ouvia/ toda noite todo dia/ a voz de Luiz Gonzaga,/