“Coleciono todos os memes da Odete Roitman”, afirma Débora Bloch, vilã de Vale Tudo

A atriz, que interpreta a vilã do remake da obra de Gilberto Braga, fala sobre o sucesso da novela que estreia, na próxima segunda-feira (26/05), na Globo Portugal.

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Intérprete da vilã Odete Roitman, de "Vale Tudo", Débora Bloch vê muitos avanços no Brasil em relação aos anos de 1980 Divulgação/ Rede Globo
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Odiada quando Vale Tudo foi exibida em 1988, na Globo, com a atuação impecável de Beatriz Segall (1926-2018), desta vez, Odete Roitman caiu nas graças do público. Principalmente o das redes sociais, que ainda não existiam naquela época. Ao PÚBLICO Brasil, Débora Bloch, 61 anos, que interpreta, no remake, a empresária bilionária, preconceituosa e sem caráter, conta que se diverte com os memes da personagem. E acrescenta que “o vilão da ficção é menos ameaçador do que uma pessoa real com comportamentos negativos”. A atriz também acredita que, quando a novela foi lançada, “a desigualdade social brasileira era muitíssimo mais acentuada que hoje”.

Em território luso, a nova versão da obra de Gilberto Braga (1945-2021) vai ao ar a partir da próxima segunda-feira (26/05), na Globo Portugal. Na história, Taís Araújo vive a trabalhadora e honesta Raquel, enquanto a filha, Maria de Fátima, interpretada por Bella Campos, é uma golpista capaz de passar a perna na própria mãe. Nos anos de 1980, Regina Duarte e Glória Pires defenderam os respectivos papéis.

Paolla Oliveira (Helena Roitman), Cauã Reymond (César) e Alexandre Nero (Marco Aurélio) também fazem parte do elenco. Na trama original, Cássia Kiss, como Leila, foi a assassina de Odete Roitman. O capítulo que revelou quem matou Odete Roitman parou o país. A seguir, cinco perguntas feitas pelo PÚBLICO Brasil à intérprete da vilã mais amada e execrada da teledramaturgia brasileira.

Havia uma grande expectativa em outra atriz fazer a icônica Odete Roitman. Mas o público parece amar a Odete Roitman que você interpreta. Você ficou preocupada de não gostarem?

A maturidade traz muitas vantagens. Uma delas é a confiança na nossa capacidade de desenvolver personagens interessantes. Mas, também, a coragem para enfrentar grandes desafios. Este era um grande desafio justamente pela enorme expectativa em torno do remake e da forma como Odete Roitman surgiria nesta versão. A primeira foi um grande acerto e sucesso em todos os níveis, e isso só aumentava a nossa responsabilidade. Felizmente, tem sido um enorme sucesso desde a estreia (no Brasil), e isso me deixa muito feliz.

Você acompanha os memes que fazem com a personagem nas redes sociais? Acha engraçado?

Acho muito engraçado e, inclusive, coleciono todos os memes e piadas que surgem. É muito divertido ver uma personagem ganhar essa dimensão.

Na internet também falam que a personagem tem "toda razão de esculhambar" os filhos, que seriam "dois encostados". Você fica espantada de a vilã virar uma queridinha do público?

Não é muito espantoso ver o público sentir identificação pelos vilões na ficção. Na história da dramaturgia, existem inúmeros exemplos de personagens malévolas, que se tornam admiráveis para o público, seja pelo carisma e pelo poder que possuem, seja por refletirem medos e ansiedades ou pela simples exploração do lado sombrio do público num ambiente controlado. Como se fosse uma forma de testarmos, de maneira segura, emoções e fantasias de transgressão e manipulação que não podemos realizar no cotidiano, sem condenação social ou moral diretas. O vilão da ficção é menos ameaçador do que uma pessoa real com comportamentos negativos, o que torna a identificação mais fácil e segura. Por outro lado, Jung (Carl Gustav, fundador da psicologia analítica, 1875-1961) nos explicou que os vilões ativam arquétipos presentes no inconsciente coletivo, conectando-se com o indivíduo em níveis profundos e simbólicos, o que reforça o seu fascínio. No caso dos filhos da Odete, apesar de não terem uma atividade laboral comum, eles são produtivos. O Afonso (Humberto Carrão) fez doutorado e tem uma carreira acadêmica e a outra é artista plástica, ainda que com alguns períodos improdutivos devido ao alcoolismo, que é uma doença grave.

Você viu a versão original? Qual é a maior diferença, do ponto de vista social, ético e econômico, entre a novela dos anos 80 e o remake?

Na época, não assisti a muitos capítulos porque fazia teatro naquele horário. Quando recebi o convite para interpretar Odete Roitman, vi alguns capítulos, mas percebi que não me ajudava no meu trabalho, e acabei não vendo tudo. Eu precisava criar a minha Odete e não reproduzir o que a Beatriz Segall já tinha feito brilhantemente. As diferenças do ponto de vista social são enormes. O Brasil acabara de sair de um longo período de ditadura militar infame e vivia uma certa euforia libertária. Era um momento em que o Brasil voltou a ser um país possível para os jovens, para se sonhar. A desigualdade social era muitíssimo mais acentuada que hoje. Os níveis de pobreza, preconceito e discriminação também. Uma diferença importante e positiva que vemos no remake é a quantidade de atores negros com protagonismo. Eles não estavam na primeira versão. Esse é um avanço muito grande e importante que fizemos no Brasil.

Qual é a sua relação com Portugal? Gosta do país, da culinária?

A minha relação com Portugal é antiga e muito próxima. Adoro o país, e viajo para Portugal sempre que posso. Parte do meu coração está aí. E do meu estômago também. Passo o ano sonhando com os peixes extraordinários, o leitão, o cabrito e o bacalhau.