No Fundão, interior de Portugal, Brazuca é sinônimo de gente feliz e empreendedora
Cidade portuguesa reúne imigrantes de 70 nacionalidades e abriga histórias de sucesso de brasileiros que abriram empresas e se destacam em diferentes setores. Comunidade se integra a costumes locais.
O município do Fundão, no distrito de Castelo Branco, região Centro de Portugal, tornou-se exemplo de diversidade cultural e de inovação empreendedora. Com cerca de 26 mil habitantes e imigrantes de 70 nacionalidades diferentes, a cidade tem recebido uma injeção de ideias nos últimos anos. Entre os protagonistas desse movimento estão brasileiros, que abriram empresas e encontraram no interior português um espaço fértil para crescer.
O PÚBLICO Brasil esteve na cidade e conversou com empreendedores cujas trajetórias revelam os desafios e conquistas dessa jornada. O pernambucano Ricardo Danayalgil Júnior chegou ao Fundão há quase três anos, atraído por programas de incentivo da Câmara Municipal nas áreas de tecnologia e inovação. Ele participou de um projeto que buscava soluções para demandas tecnológicas e conseguiu transferir sua ideia, desenvolvida no Recife, Pernambuco, para Portugal.
No Fundão, Ricardo fundou a The Danyalgil Company, em sociedade com o irmão, Tiago. O primeiro projeto da empresa consistia em rastrear produtos agrícolas desde a colheita até a entrega final ao cliente, que pode acessar todas as informações por meio de um QR Code. “A The Danyalgil começou com esse projeto, que evoluiu para vários outros. Hoje, esse produto cresceu tanto, que se inseriu na área têxtil de Portugal. Criamos um mecanismo que atende a demanda e resolve os problemas das empresas”, afirma.
Atualmente, o empreendimento de Danyalgil atende 50 companhias de grande porte e milhares de usuários independentes em uma plataforma de serviço remoto. Com uma equipe enxuta e processos automatizados com inteligência artificial, Ricardo destaca o acolhimento que recebeu na cidade.
“Como forma de gratidão com a cidade, eu e meu irmão decidimos que, mesmo que a gente evolua e vá para outros lugares, sempre teremos nossa base no Fundão. Para a coisa funcionar aqui, dou uma dica: seja o mais brasileiro possível, mas respeitando a cultura do lugar onde você estiver morando”, diz.
Ponto de encontro
A paranaense Narion Coelho chegou ao Fundão em novembro de 2021, acompanhando o marido, engenheiro eletroeletrônico contratado por uma empresa portuguesa. Após analisar a qualidade de vida, custo e tranquilidade para criar os filhos, a família optou pela cidade, em vez de Lisboa ou Porto.
No Brasil, Narion trabalhava com eventos ligados à educação física, mas, no Fundão, encontrou uma nova vocação: abriu o Empório CWB, loja de produtos brasileiros que, rapidamente, se tornou ponto de encontro da comunidade local. “Tem pessoas que vêm aqui comprar algo e, quando percebemos, já estamos conversando por uma hora. A gente vai conhecendo as pessoas, se apega e acaba formando uma grande família”, conta.
Além do comércio, Narion é uma das fundadoras da Associação de Apoio Brazuca e Amigos, que auxilia imigrantes na adaptação ao país. Um dos eventos promovidos pela entidade, o Arraiá Luso-Brasileiro, reuniu 800 pessoas em sua última edição, neste ano. “Estamos aqui para provar que Brazuca não é pejorativo. Hoje em dia, o brasileiro já tomou conta do termo. Fala em Brazuca e você já pensa em uma pessoa feliz”, afirma.
A empreendedora também alerta sobre o processo de imigração. “Quem mudou de país tem que se adaptar aos costumes locais. Se achar que não vai desapegar da vida que levava no Brasil, então, melhor nem emigrar, pois vai chegar, passar um tempinho e ir embora. Às vezes, vai até se frustrar porque não deu certo”, adverte.
Escritório internacional
A carioca Gabriella Sá mudou-se para Portugal em dezembro de 2018 para cursar mestrado em Lisboa. Para se sustentar, trabalhou em sorveteria, telemarketing e atendimento ao cliente até receber proposta de uma empresa do Fundão. A adaptação à cidade foi natural: o valor que pagava por um quarto em Lisboa correspondia ao aluguel de um apartamento só para ela no interior.
Gabriella, que hoje divide o tempo entre Fundão e Barcelona, é sócia do escritório BSA Advocacia Internacional, que trabalha de forma remota, e atua em Portugal, Espanha e Brasil. Sua empresa reúne sete profissionais e atende entre 70 e 100 novos clientes por mês, além de trabalhos fixos.
“Não vim às escuras: já tinha trabalho, inclusive tive apoio da Câmara, que na época pagava metade do meu aluguel, num programa para trazer trabalhadores de cidades grandes para cá”, lembra a brasileira.
Para ela, o planejamento é o diferencial. “O planejamento é sempre o principal para uma carreira de sucesso no exterior. A mentoria que faço é para facilitar o caminho dos advogados que querem chegar a Portugal e na Espanha e trabalhar com imigração”, explica. E completa: “Sempre digo que uma pessoa documentada é uma pessoa livre. Os problemas existem mas a gente tem que focar na solução”.